quarta-feira, 25 de abril de 2012

"Bem Vindo Ao Coração de Electra!"



NOTA: os nomes de canções mais claros são links para ouvi-las!


A vulnerabilidade. A voracidade. As duas faces de um mesmo coração. Um coração que consome com seus desejos e vontades tudo à sua volta, encantando e matando, com o único objetivo de preencher as faltas. As faltas que enchem esse mesmo coração voraz de uma certa vulnerabilidade. É assim que, na minha opinião, se constrói Electra Heart, o novo álbum da Marina & The Diamonds.

Marina decidiu criar uma série de personagens que demonstrassem, em graus distintos, a dualidade criada pela carência e ambição propriamente humanas. E nessa tapeçaria, podemos encontrar fios de amor e desilusão, com algumas falhas de personalidade descosturando aqui e ali o tapete... Assim, criando imagens desgastadas ou desgastáveis, as diferentes vidas que residem no coração de Electra estão sempre em busca de redenção... Ainda que em círculos profundamente viciosos.

A personagem mitológica grega que ilustra o conceito por trás do álbum é uma clara representação do que o descontrole e trauma podem causar: ela arquitetou e matou a própria mãe, vingando assim o assassinato do pai que ela tanto adorava. O pai, Agamenon, teve de anos antes escolher uma de suas filhas para ser sacrificada, e Electra foi salva. Sua mãe, porém, não suportou a perda e decidiu se aliar ao sobrinho dele, para que fizessem o que foi feito. A filha que sobreviveu ainda foi relegada ao tratamento de uma escrava, e como resultado, eliminou a figura materna de seu próprio coração... O coração de uma criança crescida, uma criança que não pôde amadurecer e diante de todo seu sofrimento, conseguiu somente guardar-se em mágoa e desejo de morte. Sua própria morte, até.

E é exatamente aí que se insere o texto para Electra Heart! A imagem de uma divertida lolita, devoradora de homens, querendo que todos a idolatrem e façam tudo por ela, indo de anjo a demônio sob o jugo da mínima contrariedade... São várias as faces que povoam o álbum na forma dos ditos arquétipos (Primadonna, Destruidora de Lares, Su-barbie-ana e Adolescente Inútil), e todos eles se unem por seu vazio, sua falta de identidade, uma inexistência que as torna, em maior ou menor grau, impetuosas, furiosas, más. Bad girls, se o termo vem a calhar. Aqui também é possível encaixar à pungente crítica ao Sonho Americano, de que é sim possível viver num estado além do real, basta somente negar-se a ter os pés no chão... Caindo vez ou outra, mas com os pés fora do chão.

Nesse percurso, porém, o Coração de Electra parece adquirir uma outra consciência. Se nas primeiras canções, lidar com o amor é difícil (Lies, Starring Role), tornando-o num jogo de ganhar ou ganhar (Primadonna, Homewrecker e Power & Control), à medida que o álbum evolui, vê-se sentimentos mais depurados sendo agregados à “narrativa”, na forma de uma consciência cada vez mais aguçada dessa suposta irrealidade da vida. É o que vemos em The State of Dreaming (e seu apoteótico refrão, “My Life is a Play!”), Living Dead, alcançando um pretenso ápice na apatia de "Valley of The Dolls", quando ela entoa, com desinteresse, que “got a hole inside of me”.

É a partir daí que o disco caminha pra um final “esperançoso”, se comparado às ideias veiculadas no começo. Em “Hypocrates”, ouvem-se ecos de infância em seu piano introdutório, para depois sermos confrontados com uma melodia mais “terrígena” e centrada, ainda que agridoce. Como se o coração de Electra pudesse se deparar com as coisas que lhe esvaziam, mas com um certo “let it be”... Deixando ir, deixando que aquilo se desfaça por si. Finalmente, o gran finale do álbum surge com a melancólica, mas sensata, "Fear and Loathing", uma clara análise da personagem sobre quão degradada foi sua vida em função das escolhas que fez, e que deixou que fizessem por ela:


I lived a lot of different lives

Been different people many times

I lived my life in bitterness

And filled my heart with emptiness

And now I see, I see you for the first time

There is no crime in being kind

Not everyone is out to screw you over

Maybe yeah, just maybe they just want to get to know ya


And now the time is here

Baby you don't have to live your life in fear

And the sky is clear

Is clear of fear...

Don't want to live in fear and loathing

I want to feel like I am floating

Instead of constantly exploding

In fear and loathing


“Baby, you don’t have to live your life in fear”. O mesmo medo que nos impulsiona ao isolamento, à tentativa frustrante de conseguir consolo para nossas mazelas dentro somente de nós mesmos. De preencher o vazio com mais vazio, prendendo-se ao que lhe torna algoz de si próprio. Vivendo, portanto, de medo e repulsa.

O reconhecimento de que é possível ter um entendimento mais profundo, criando uma satisfação mais concreta do que a proporcionada pelo que vem da posse, é isso que leva ao final grandioso e que soube se construir destoante do restante do disco. Como se não bastasse Electra Heart ser complexo em seu universo, ele forma sem dúvida alguma um único e vasto universo. Ouvi-lo em sequência dá a cabal impressão de que ele foi construído perfeitamente, indo da ilusão que queima os olhos em meio à escuridão da noite até a luz de um dia frio, mas suficiente para acordar, fazer ver que existe mais coisas a se conquistar. A própria Electra, ainda que, tomada pela fúria, tenha consumado o assassinato da mãe, descobriu que a indiferença desta nos últimos anos de vida era uma tentativa de protegê-la contra seu então marido, o sobrinho de Agamenon.

Como de um rio desviado que retorna a seu fluxo natural, o Coração de Electra encontra seu curso. Mesmo que às vezes o desvio tenha sido divertido, furtivo e depreciativo, ele encontra seu curso, caminho.

3 comentários:

  1. TO EMOCIONADISSIMO! :~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

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  2. Olá! :D é o dono do blog de fãs da Marina!
    Agradeço muito pelo apoio ao meu blog.

    Gostei muito da tua composição ao "Electra Heart". :D

    Continua a acompanhar o blog para saberes as últimas novidades da Marina e conferires entrevistas traduzidas.

    Abraços :)

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    1. E eu agradeço por ter lido minha composição :D
      Estarei ligado, grande abraço!

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