segunda-feira, 30 de abril de 2012

Sobre quem podemos ser.

Existem muitas coisas que passam pela minha cabeça quando penso em minha sexualidade... Algumas contraditórias, o que faz com que me sinta estúpido e ignorante, mas na maior parte do tempo tenho uma mente centrada e sei exatamente no que acredito e desacredito, sobre as percepções estranhas que possam ter de mim e de meus companheiros LGBT... Ainda que diga menos do que pense, uma fraqueza.

Minha cabeça acelerou mais cedo quando li algum tweet falando sobre homossexuais respeitarem heterossexuais. Sabe, eu nem li o tweet direito, não sei exatamente qual a afronta apontada, mas me vi confrontado com uma série de questões sobre as quais tive de escrever. Por isso este texto, na tentativa de pôr para fora coisas que, espero, sejam relevantes aos olhos de vocês. Aí vai...

Na cabeça de muitos, inclusive homossexuais, exigir direitos e o respeito devido é cercear o espaço de um heterossexual. Pois bem, não é. Nenhum gay militante quer ferir a liberdade de quaisquer outras pessoas - a questão é que muitos não percebem um fato pivotante: ferir nossa liberdade é (ou pelo menos deveria ser visto como) tão absurdo quanto. Essa eterna afirmativa de que nascemos LGBT não tem outra função senão frisar que assim como a cor de uma pele, somos como somos porque SOMOS, simplesmente. Imaginem vocês uma igreja pregando que negros vão pro inferno se não se arrependerem de sua negritude? Eles por um acaso podem abnegar-se de sua "condição preta"? No mínimo tosco, né? O mesmo vale pra LGBT.

O respeito que exigimos não é apenas uma tolerância fajuta que mascara preconceitos, não permitindo a ninguém desenvolvimento em termos humanos. Há quem diga: "você pode ser gay, só não seja perto de mim e da minha família que estará tudo bem..." Isso me deprime porque SER LGBT NÃO ME TORNA DEGRADANTE. Degradante é vermos crianças jogadas na rua e dormirmos em nossas camas sem a mínima lembrança disso. Degradante é desperdiçamos todos os recursos que temos, quando nas casas de nossos irmãos falta água, falta pão. Degradante é sermos alvo de um ódio sem sentido, uma vez que a bandeira LGBT prega o AMOR, o AMOR como estatuto maior da experiência humana. Lembro a todos vocês que o próprio Jesus Cristo deixou como mensagem maior: AMAI-VOS UNS AOS OUTROS.

E amar é compreender, mesmo que para isso você use antes o seu coração.

Uma outra questão que preciso levantar é do que, creio eu, origina a homofobia e ainda está engendrado demais no discurso religioso: o MACHISMO, em último grau. O texto bíblico diz: "Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural no que é contrário à natureza; semelhantemente, também os varões, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, varão com varão (...)", o que me leva à conclusão de que tudo se trata de papéis, "naturais" ou não. O estabelecimento do que é do homem e da mulher é algo que evoluíu para, mesmo com esforços contrários, a ressignificação destes papéis, uma fluidez que só denota como nos tornamos quem somos também pela influência que recebemos do nosso meio. Poderia ser questionado então: "você pode ser influenciado a ser gay". E eu responderia que sim, talvez seja, mas exatamente onde estou errado por ser quem sou hoje? Ser gay não é errado, tampouco certo. Ser gay não é estar doente, tampouco sadio. Ser gay não é pecar, tampouco ser virtuoso. Ser gay prescinde traços de nosso caráter e por isso não admito que me rebaixem, ainda mais por isso.

Um heterossexual vale tanto quanto um homossexual, e vice versa. Preciso repetir?

Por fim, cito outro aspecto fundamental nisso tudo, algo vindo também do próprio universo religioso: "Não julgue se quiser não ser julgado". E para tal, deixo uma música que ouvi para escrever esse texto - chama-se Hypocrates, e vem do CD Electra Heart, Marina and The Diamonds, sobre o qual escrevi pro blog também (LINK). Aqui um trecho da letra:

Você sabe que quer apenas me possuir
É este o tipo de amor que você me mostra
Você me diz uma coisa, e faz outra
Mantém todos seus segredos bem guardados...

Quem é você então para me dizer quem devo ser?




Quem é você para me dizer quem devo ser, se vivemos debaixo do mesmo céu? Somos irmãos, viemos e voltamos ao mesmo chão. E se Deus quer que nos amemos, por que não nos amamos, então?

5 comentários:

  1. Neto, é sempre um prazer ler os seus textos, como sempre, tendo algo importante a ser dito. Você não imagina o quanto me incomoda o fato de você não ter o devido reconhecimento por sua arte de escrever, pelo menos ainda não. Se bem que, bem, você sabe que tem, para as pessoas certas. Amo muito o modo como você fala, com sua voz, sobre o que é coletivo, sobre o que é, ao mesmo tempo, individual e lírico, mitológico. Obrigado por ser fonte de inspiração.Você simplesmente é. <3

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  2. Ain, Bê :D Muito obrigado pelo seu apoio, ele sempre me fortalece :****

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  3. Ai ai ai, belo texto pra falar de uma realidade que me entristece muito também. Eu preciso me controlar pois sempre que alguém sequer esboça algum tipo de intolerância contra gays eu já quero sair brigando e levantando bandeiras (e normalmente não me contenho, quando vejo já estou discutindo rs). Não só tenho mais amigos gays do que heteros (eu acho que atraio gays haha), como acho que vejo nos gays uma "fragilidade" (coloco entre aspas pq, graças a Deus, isso vem mudando muito) da qual eu sempre sofri quando era criança e ninguém nunca me defendeu (eu sou mais uma representante do velho clichê da criança tímida e CDF que sofreu a infância toda e tem de fazer terapia hj haha). É um troço meio doido. Mas enfim, não canso de me entristecer com a incapacidade das pessoas de conviver com diferenças e respeitá-las. E se cada um apenas cuidasse mais de sua própria vida e menos da dos outros, já ajudaria. Mas enfim, é sempre legal escrever a respeito e conversar com as pessoas! Me empolguei no comentário. rs Belo texto! :* (PS: eu sou a Samanta, do FB ;)

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  4. É uma pena muitos dos jovens não terem prestado atenção na lição que os x-men passam para nós desde pequenos. Devemos aceitar quem nós somos e devemos sim lutar por um mundo melhor. Como fazer isso? Não fugindo da responsabilidade que você tem com as pessoas que você ama. Acho sim que gays devem mostrar para família e amigos que são normais como qualquer um. Sei que isso é muito difícil, eu mesmo não encarei toda a família ainda, mas já conversei com alguns. Com amigos e trabalho eu sou totalmente assumido e todos sabem da minha cabeça militante. Acho ótimo as pessoas repararem como eu acho minha condição normal. Isso choca alguns. Isso é um barato para outros. O mundo não vai mudar do nada e nos aceitar como homossexuais. Devemos ser corajosos, ter amor dentro de nós e espalhá-lo por aí, assim como o Hernando disse em suas belas palavras.

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  5. É fundamental que tomemos seus exemplos, Sami e Pedro! E MUITO OBRIGADO pelos comentários :D

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