quinta-feira, 7 de junho de 2012

O que eu achei do MDNA!




NOTAS: As músicas citadas podem ser ouvidas abrindo os links associados a seus nomes.


Demorei a escrever sobre o MDNA, o último álbum da Madonna, por um único motivo: discos só se mostram realmente bons ou ruins quando, depois de algum tempo, eles não perderam o gás, não cansaram aos ouvidos. E digo que, mesmo não sendo o trabalho mais bem elaborado por Madonna, o MDNA tem elementos que cativam e, sendo descobertos e redescobertos, garantem uma audição prolongada e satisfatória... Resumindo, o CD é BOM, na minha humilde opinião.

Antes de ir aos pontos positivos, quero tratar dos negativos, especificamente de um: o MDNA é um álbum sonicamente fragmentado, e como minha amiga Amanda havia dito antes, é praticamente óbvio que assim seja, até na capa dele você vê um rosto todo repartido. E isso deve ter ocorrido por dois motivos: falta de tempo da própria Madonna para se dedicar ao projeto de forma integral (um dos produtores desabafou dia desses sobre isso - leia AQUI) e o envolvimento de 5 produtores, dos quais se destacam três: Benny Benassi (criador de um ótimo remix pra "Celebration"), Martin Solveig (do hit "Hello") e William Orbit, que tem como cartão de visitas o Ray of Light (precisa falar mais?). No entanto, o maior "erro" do MDNA não é sua fragmentação em si. Na verdade, foi o desejo de fugir dela que fez com que o álbum se tornasse uma viagem com altos e baixos, e falo porquê.

Madonna já havia deixado claro, antes mesmo dele receber um nome, que seu novo trabalho tinha elementos mais extrovertidos, vindos de Solveig, e outros mais introspectivos, próprios do que ela fizesse com Orbit. Quando se ouve o álbum muitos desses elementos vão se misturando, e talvez se fossem apresentados em blocos melhor definidos, escutar o MDNA seria uma experiência mais clara. Afinal, se fica difícil conciliar um pop grudento como Give Me All Your Luvin' com algo tão violento e sexy como Gang Bang, talvez o melhor seja que não estejam verdadeiramente conciliados; poderiam estar melhor agrupados. Depois de tanto ouvir o disco, eu criei uma tracklisting melhor, que postarei no fim da publicação ;)

Agora, vamos ao trigo, já separado o joio. Este disco representa o que o Like A Prayer foi para Madge no divórcio com Sean Penn. Mesmo já tendo se passado 4 anos da separação de Guy Ritchie, no Hard Candy o tópico não se fez tão presente, uma vez que eles ainda eram casados e em algumas músicas apenas o desgaste era evidente (Devil Wouldn't Recognize You; Voices). Ela precisava exorcisar demônios, vindos não só do fim do relacionamento, mas de sua idade, da concorrência com cantoras mais jovens, além da vida de mãe solteira... E se o assunto é exorcismo, Madonna decidiu por tomar o mesmo caminho do álbum de 1989: falar exaustivamente de religião, outro dos demônios do qual a Rainha do Pop nunca pôde se desvencilhar.

E a temática religiosa é a base para a primeira canção do álbum, GIRL GONE WILD. Cantando sobre uma "garota" que se vê envolvida por um homem sexy e encantador, ela diz sentir esse "burning hot desire", e que ninguém poderia "put out my fire"... Ok, onde entra a religião mesmo? Ela começa a canção orando o Act Of Contrition (que inclusive já havia dados às caras no Like A Prayer), e afirmando que queria de todas as formas ser uma "garota boa" - a garota boa então pira e acaba assumindo que na verdade não era boa coisa nenhuma, ela continuava sendo uma bad girl... E se você ouve I Don't Give A, sabe muito bem que ela "tried to be a good girl, tried to be your wife" - já viu, né?



O exorcismo continua com a pungente GANG BANG! Numa espécie de bad trip, a personagem desse pequeno conto sangrento percebe que a pessoa a quem ela mais amava na verdade era sua inimiga e decide sair atrás dela para matá-la, nem que isso a levasse ao inferno (religião de novo...)! Em meio a uma batida marcante e sons de tiros e gatilhos sendo acionados, Madonna canta que tem medo, mas quer ir até o encontro de seu opressor, para lhe dizer umas poucas verdades! É aí que a Bad Girl se revela realmente... Imbuída de loucura, ela grita:

"You had to die for me baby
You had to die for me baby
You had to die for me baby

How could I move on with my life
If you didn't die for me baby
If you didn't die for me baby
I need you to die for me baby

Bang Bang, shot you dead,
Shot my lover in the head
Now my lover is dead, and I have no regrets
He deserved it!"

É evidente como Gang Bang retrata um crime passional; Madonna decide matar aquele que um dia ela julgou não poder viver sem ela - e talvez tenha feito esse julgamento por ela mesma se sentir dessa maneira. O amor vira ódio quando somos feridos naquilo que mais acreditamos, e é isso que a música transmite... Se ele agiu como um canalha, que morra como um canalha!

Chegamos à I'M ADDICTED, e a narrativa que estava começando a se construir perde um pouco de seu fio. É uma ótima faixa dançante, que inclusive batiza o álbum ao fazer uma brincadeira com os acrônimos MDNA - MDMA, referindo-se então ao disco como uma droga tão extasiante quanto (MDMA é o princípio ativo do ecstasy). Logo é seguida por um momento "iluminado" do álbum: TURN UP THE RADIO. Essa canção, um descarte de Martin Solveig no qual Madge decidiu se debruçar, é cheia de fôlego e tem potencial para ser um hino em nome da liberdade. Ela, porém, também mostra um pouco das frustrações subjacentes à essa vontade de se libertar, uma vez que Madonna canta:

"I'm Stuck like a moth to a flame
I'm so tired of playing this game
I don't know how I got to that state,
Let me out of my cage cause I'm dying!"

Esqueça seus problemas aumentando o volume do rádio até os autofalantes explodirem! Essa é a mensagem.

Além do demônio-divórcio, outra das preocupações de Madonna era de se autoafirmar como a maioral no mundo do Pop. E para isso, ela se usa de 3 músicas: GIVE ME ALL YOUR LUVIN', SOME GIRLS e I DON'T GIVE A. A primeira, que serviu de single ao álbum, é adolescente ao extremo, pela temática cheerleader, seu ritmo esquentado e a letra carente, pedindo ao ouvinte que a dê todo seu amor, e é pra hoje! hahahahah Madonna se usa de uma ironia tão refinada (ou seria escrachada?) que quase passa despercebida, ficando evidente somente quando o clipe da música saiu e, em seu início, se ler que "fãs podem te fazer famoso, um contrato te fazer rico, a imprensa lhe tornar um superstar, mas só o amor lhe torna um jogador". Não vou me aprofundar muito na letra, pois o Madonna Now já fez isso, e você poderá ler AQUI. Some Girls, por sua vez, tem uma letra em que Madge aponta diferentes tipos de garotas, afirmando que "some girls are not like me", reiterando enfim que "I'll never wanna be like some girls"... Dessa, eu diria que o melhor é a ponte com as guitarras bem próprias do William Orbit (ouça bem alto no fone de ouvido, é a dica!).



I Don't Give A, a terceira e última das canções, merece um destaque, por ser um pouco mais complexa que as anteriores. Numa espécie de Rap a la American Life, M canta sobre as agruras de ser mãe solteira, ter passado por um divórcio conturbado, e ainda ter uma carreira extremamente corrida. Mas em que momento exatamente ela se autoafirma? Ao apontar que ela mal sente a pressão de tudo isso, e que se você tem algum problema em ela fazer 10 coisas ao mesmo tempo, ela não dá a mínima. O melhor momento dessa música surge mesmo quando, num instante de fragilidade, Madonna confessa os seguintes versos:

"I tried to be a good girl
I tried to be your wife
Diminished myself,
And I swallowed my light

I tried to become all that you expected of me,
And if I was a failure, I don't give A..."

Pra completar, Nicki Minaj, que participa com M.I.A. em GMAYL, canta um rap e termina com a cereja do bolo: "There's Only One Queen, and That's Madonna, Bitch!" - isso, emendado com um coro sombrio que surpreendentemente combinou com a música, faz de I Don't Give A mais um momento de redenção. E redenção leva a... Religião. Portanto, é hora de cantar numa atmosfera lisérgica que "I'm a Sinner, I like it That Way!"

I'M A SINNER é uma canção que muita gente não gostou por remeter um pouco demais à influência indiana sobre o Ray of Light, bem como ao hit Beautiful Stranger. A música porém é mais focada em se afirmar como um ser humano, e se isso significa ser pecador, que seja, ela gosta de viver assim! Amparada mais uma vez pelas guitarras orbitnianas, Madonna até dedica uma ponte a ícones religiosos do Catolicismo, algo contrastante com os primeiros versos, bem viajados por sinal. De um jeito ou de outro, é uma música divertida e acaba servindo como um relax para a sequência de rituais exorcistas anteriores. É a partir dela que o disco chega a um momento mais calmo, e centrado. E começamos pela que talvez seja a melhor música do MDNA, uma triste ausência na nova tour: LOVE SPENT.

"You had all of me
You wanted more
Would you have married me
If I were poor?
I guess if I was your treasury
You'd have found the time to treasure me

How come you can't see
All that you need
Was right here with me
Up until the end
All this pretend wasn't for free

Hold me like your money
Tell me that you want me
Spend your love on me
Spend your love on me
Now you have your money
Spend it til there's nothing
Spend your love on me
Spend your love on me..."

Madonna pela primeira vez fala do divórcio com um tom mais sereno, e dessa vez, como se pôde ler nos versos acima, a crítica é ao aparente materialismo de Guy Ritchie. A questão é que um sentimento se faz presente pela primeira vez no CD, algo tão genuinamente humano quanto o orgulho: a humildade de admitir que sim, ele faz falta. Ainda que ela cante que se sente "esgotada no amor" (love spent, rs), o último verso dessa canção maravilhosamente pontuada por um banjo é o singelo e entregue: "hold me in your arms until there's nothing left". Dá uma dorzinha pensar nisso...

Passada Love Spent, vamos para o calmo desfecho do MDNA: primeiro MASTERPIECE, depois FALLING FREE.

Masterpiece só entrou no álbum por ser uma canção ganhadora de um Globo de Ouro. E muita gente torceu o nariz para ela, inclusive Elton John (risos eternos), talvez por sua crueza em termos instrumentais e a letra, que começa meio boba ao falar da Mona Lisa. Quando digo "começa", é porque em pouco tempo as metáforas se mostram mais inteligentes. Os melhores exemplos está no próprio refrão:

"And I'm right by your side
Like a thief in the night
I stand in front of a masterpiece
And I can't tell you why
It hurts so much
To be in love with the masterpiece
'Cause after all
Nothing's indestructible"

Dizer que você se sente como um ladrão diante de uma obra prima ao olhar para alguém é no mínimo interessante. E emendar com a dor que essa obra prima causa é genial! Dói porque você quer se equiparar e sentir que é digno do que vê à sua frente. Dói porque sentir algo tão bom é pecado (religiosa essa Madonna!). Mas não deveria doer pois nada, nem mesmo uma obra prima, é perfeito. 'Cause, after all, Nothing's indestructible...



O álbum então conclui-se com Falling Free, uma belíssima balada orquestral com algumas poucas intervenções eletrônicas. A canção remete um pouco mais ao Ray of Light, e mesmo tendo uma letra que parece em alguns momentos se perder em seu curso, consegue passar sua mensagem. E aqui está a verdadeira redenção: em Falling Free, M canta sobre compreender que nem tudo na vida é compreensível, e que às vezes as coisas são como são, o que as exime da obrigação de terem explicação. É por isso que ela canta:

The face of God who stands above
Pouring over hope and love
That all of might, and life, and limb
Could turn around a love again
When I let loose the need to know
Then we're both free, free to go...

I'm falling free

(...)

Deep and pure our hearts align
And then I'm free, I'm free of mine
I let loose the need to know
Then we're both free, free to go

Através dessas palavras, Madonna demonstra que se os demônios não foram exorcisados, ao menos agora ela poderia lidar melhor com o que eles causaram. E o MDNA, que começa urgente, sufocante e sufocado, termina calmo.

Deep and pure... Calmo.


Concluindo: o MDNA é um álbum que pode soar muitos em um só, mas me parece que seus temas convergem para um grande estatuto: de que não importa quanto estresse surja ao redor de Madonna, ela será capaz de se reerguer e mostrar que ela continua forte e em seu lugar, como Rainha do Pop. Talvez ela nem precise de tanta autoafirmação, mas essa "fragilidade" só mostra como Madonna pode ser A Rainha, mas isso não a torna menos humana. Essa é a dádiva do MDNA.

Hernando

ps1: SUPERSTAR é uma música fofíssima, uma joia, mas acabei não a envolvendo no texto por ser talvez a mais distante tematicamente do MDNA.

ps2: As faixas bônus são mais leves, ainda que I FUCKED UP e BEST FRIEND (ÓTIMA produção dos Benassi) também abordem o divórcio. Ambas porém seguem a linha das últimas canções, denotando uma certa resignação. Valem a pena.

ps3: a faixa Beautiful Killer, última bonus track que cito aqui, ganhou uma versão ao vivo linda, no show feito para o Olympia!



ps4: logo abaixo eu apresento uma tracklisting do MDNA que, na minha opinião, melhora a audição do disco; se vocês ouvirem, por favor me digam depois o que acharam ;)

GIRL GONE WILD
SOME GIRLS
GANG BANG
I'M ADDICTED
TURN UP THE RADIO
SUPERSTAR
GIVE ME ALL YOUR LUVIN'
I DON'T GIVE A
I'M A SINNER
LOVE SPENT
BEST FRIEND
MASTERPIECE
FALLING FREE

12 comentários:

  1. Tô ouvindo Marterpiece aqui 4h da manhã, eu sinceramente acho uma das melhores do MDNA.
    Adorei suas análises, e se vc não fala depois eu nem lembrava de Superstar. Serio, não lembro nem da melodia! haha
    Farei sua playlist no iTunes, achei bem interessante.

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    1. Superstar é uma música de que gosto, mas como disse, ela consegue sobrar no álbum mais que some girls! hahahahahahah

      Já que ela tinha 16 músicas inéditas, poderia ter editado melhor a sequência, né? ;)

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  2. Muito boa a análise. Descobri algumas coisas que não tinha enxergado no álbum. E agora entendi melhor a musica GMAYL, não sabia desse conteúdo todo na música.
    MUITO BOM
    :)

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    1. Sim :D Na verdade, acho a análise do Madonna Now bem calorosa, mas de um modo geral foi esta a mensagem ;D Obg por ler!

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  3. Ótima resenha! Acho que a melhor que eu li. E eu concordo que um dos únicos pontos negativos do disco é o fato de ele ser tão fragmentado, não existe uma "coesão", embora os temas se repitam. Mas eu gosto bastante! E é um disco com bem mais personalidade do que o Hard Candy, apesar de q eu gosto desse tb. :D

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    1. Depois que escrevi, percebi que a fragmentação em si é mais sonora que temática. Se ela tivesse tido mais tempo e cuidado na hora de amadurecer as músicas, o álbum seria melhor reconhecido :D Obg por ler, linda!

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  4. Excelente analise perce com exatidão as falhas e os acertos!!! E adorei sua tracklist é uma transição perfeita do agitado para o mais calmo!! Parabéns!!

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    1. Obrigado, fico feliz de ver que você ouviu a tracklist também :D

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  5. Bom, acho que estou lendo em um momento em que o ciclo MDNA já foi concluído, Contudo, tenho que citar que amo o MDNA, um álbum muito bacana, adorei sua análise. Uma curiosidade muito interessante de citar é que após assistir a MDNA Tour e a sonoridade das músicas você ouve o MDNA com outra opinião e sente que as músicas eram excelentes e isso passou por despercebido.
    P.S, Estou ouvindo agora a tracklisting sugerido.

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  6. Wallace, hoje em dia eu mesmo modificaria algumas coisas da tracklisting, porque depois de tanto ouvir o disco acabou que me habituei ao formato original dele hehehehe

    Muito obrigado pela leitura e comentário <3

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